O incrível caso do FAT


Fabio Giambiagi

A ideia de que o Estado brasileiro gasta mal vem se consolidando no debate macroeconômico no Brasil. Um exemplo notável de como o gasto público vem se divorciando da eficiência é o que tem acontecido com a despesa do seguro-desemprego pago com os recursos do FAT.

Como se sabe, o governo Lula pode exibir um desempenho excelente dos indicadores de emprego. Depois de 2003, o mercado de trabalho passou a bombar, com as taxas de expansão do emprego atingindo níveis muito elevados. No conjunto dos 6 anos de 2003 a 2009, a PEA teve um aumento de 10%, a população ocupada de 15% e o contingente de desocupados teve uma redução acumulada de nada menos de 28%. O que está acontecendo em 2010 só reforça esse quadro: na média dos 3 primeiros meses do ano, a PEA subiu 1,8% e a população ocupada, 3,1%, enquanto que o contingente de desempregados encolheu em 12,1%, o que gera ao todo uma queda acumulada - se repetida no ano - dessa variável de 37% em relação a 2003.

 

O gráfico 1 ilustra o comportamento da taxa de desemprego medida pelo IBGE. Assumindo a previsão realista, para 2010, de que a taxa média do ano se situe em 7%, nós teremos experimentado uma redução expressiva desse indicador em relação aos 12,3% de 2003. O país sem dúvida melhorou por conta disso e o Governo merece crédito por tal feito. Pois bem, olhando a trajetória desse indicador, um estrangeiro que chegasse ao Brasil em 2010 poderia concluir: Que bom. Com isso, o Governo deve ter poupado parte do que antes destinava à sua rede de proteção social por conta do elevado desemprego e alocado tais recursos em outras rubricas. Curiosamente, porém, o Gráfico 2 mostra exatamente o contrário: entre 2003 e 2010, as despesas do FAT que são parte integrante das outras despesas de custeio e capital (OCC) da execução fiscal, terão experimentado um aumento real acumulado da ordem de (pasmem) 130%!!

Há algo de errado com o gasto público em um país onde o número de desempregados cai de um índice de nível 100 para um nível de 63 em 7 anos, enquanto que a despesa com seguro-desemprego aumenta de 100 para 230. O fato indica uma piora do grau de eficiência na utilização dos recursos. De certa forma, é como se esse tipo de coisas representassem o nosso lado grego. A preços de 2010, a despesa do FAT terá aumentado de R$ 13 bilhões em 2003 para R$ 30 bilhões em 2010. Em percentual do PIB, isso significa passar de 0,5% do PIB em 2003 para 0,9% do PIB em 2010. Enquanto isso, com a infraestrutura em estado precário, o país não tem recursos para fazer melhor o trabalho de proteção de encostas, as estradas brasileiras estão em estado deplorável e, em matéria de controle por instrumentos, a aviação brasileira acumula anos de atraso em relação ao estado da arte nos países avançados.

Sei perfeitamente que há algumas explicações para o fenômeno apontado, em particular o aumento do salário mínimo e a maior formalização da economia. O problema é a complacência que elas engendram. O desemprego cair e o gasto com seguro-desemprego aumentar simplesmente não faz sentido lógico. Ponto. Se há regras que explicam o paradoxo, o que se deve fazer é mudá-las, para que passem a ser mais razoáveis. Tratar da mudança de regras implicaria um outro artigo, mas não é de hoje que especialistas em legislação trabalhista como José Pastore ou José Márcio Camargo - para citar apenas dois dos nomes mais conhecidos - têm apontado para a existência de incentivos inadequados na legislação que rege os contratos de trabalho no país.

O Brasil está concluindo uma boa década. Infelizmente, ao invés de aproveitar a época das vacas gordas, estamos acentuando algumas das distorções do funcionamento de nossa economia. Uma delas é a elevada rotatividade da mão de obra, que dificulta o treinamento de longo prazo na formação de recursos humanos no âmbito das empresas. É uma pena, pois poderíamos estar aproveitando melhor os anos de bonança pelos quais estamos passando.

Fonte: Fabio Giambiagi

Instituto Milenium (http://www.imil.org.br)