Greves se espalham pelo país e Judiciário vive impasse com servidores


Há cerca de dois meses, uma série de paralisações de servidores começou a se espalhar pelos fóruns e tribunais de Justiça do país. Os funcionários cobram aumentos e reajustes salariais mas têm esbarrado na resistência dos chefes do Poder Judiciário, que alegam falta de recursos e cortes orçamentários por parte do Executivo. Neste momento, as greves atingem desde as Justiças federal, trabalhista e estadual, até a Justiça eleitoral, que em 2010 terá sua carga de trabalho aumentada, em razão das eleições gerais de outubro.

No estado de São Paulo, maior em número de servidores, de processos e de piquetes, os servidores públicos do judiciário continuarão em greve até que recebam o reajuste anual de salário previsto no artigo 37, inciso X, da Constituição Federal. Esse foi o resultado da última assembleia da categoria, realizada na quarta-feira (9/6), na Praça João Mendes, centro de São Paulo.

A Assetj (Associação dos Servidores do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo) não chegou a um acordo com o Tribunal, que classifica a greve como ilegal – mesmo sem ainda ter sido julgado o mérito do Dissídio Coletivo ajuizado pelo Sindicato União dos Servidores do Poder Judiciário do Estado de São Paulo. Já os servidores afirmam ter direito aos 20,16% de reposição salarial pela data base assegurada pela Lei estadual 12.177/05.

No mesmo dia da assembleia, cerca de 80 servidores ocuparam o fórum em protesto contra a decisão do TJ-SP de cortar os salários dos grevistas. Os prazos processuais foram suspensos durante os dois dias de ocupação.

Enquanto o acordo não vem, Tribunal de Justiça e entidades representantes das categorias vivem em pé de guerra, usando como arma a legislação.

De um lado, os servidores públicos do judiciário estadual afirmam que estão dentro da lei porque 80% dos funcionários continuam trabalhando para garantir o acesso à Justiça – os parados somam “apenas” 10 mil (em um total de 44 mil), de acordo com a Assetj. Ainda argumentam que não recebem aumento de salário desde 2004. 

De outro, o TJ afirma que a greve, do jeito que está, contraria a decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) que aplicou para o serviço público a mesma lei que regula o direito de greve do setor privado (Lei 7.783/89).

Segundo essa lei, nos serviços ou atividades essenciais, os trabalhadores são obrigados a garantir, durante a greve, a prestação dos serviços indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade.

Outro argumento é o de que não pode conceder a revisão anual de salários porque tem sofrido corte considerável de seu orçamento pelo Poder Executivo, conforme Comunicado publicado no Diário Oficial em julho de 2002. Nesse comunicado, a presidência do Tribunal de Justiça paulista informa a impossibilidade do reajuste salarial e ratifica os termos do acordo firmado com a Comissão de Negociação em 14 de setembro de 2001. Este acordo foi firmado para encerrar a greve deflagrada pelos servidores do Judiciário em 2001, na qual reivindicavam reajustes salariais e melhores condições de trabalho.

 Â“A alegação apresentada pelo Tribunal de Justiça — corte do seu orçamento, por parte do Poder Executivo — não se sustenta em confronto com o Demonstrativo da Despesa com Pessoal Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social referente ao período de janeiro a dezembro de 2007, publicado no Diário Oficial de 31 de janeiro de 2008, dele constando que o total da despesa com pagamento de pessoal atingiu o percentual de 3,87%, muito aquém do limite prudencial previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal”, afirma a presidência do Sindicato União dos Servidores do Poder Judiciário do Estado de São Paulo.

“Não reivindicamos aumento, apenas a revisão salarial de acordo com a inflação. A defasagem de 20,16% de reajuste nos impede de continuarmos nosso trabalho”, defende José Gozze, presidente da Associação dos Servidores do Tribunal de Justiça de São Paulo.

Em meio a todas essas discussões, o impasse pode prejudicar o andamento de mais de 18 milhões de processos (levantamento do TJ feito em março). Liminares, audiências, despachos, penhoras, mandados de prisão e alvarás de soltura não estão sendo cumpridos. Dos 450 fóruns de São Paulo, cerca de 60% estão com as atividades paralisadas desde 28 de abril, quando a greve teve início.

Mordaça

No mês de maio, o desembargador Elliot Akel concedeu liminar no Dissídio Coletivo à favor do governo do estado de São Paulo determinando que o Sindicato União “abstenha-se de promover a paralisação, total ou parcial, das atividades de seus representados (...), sob pena de multa diária de R$ 100.000,00 (cem mil reais) (...), determinando-lhe, mais, que não deflagre outras greves até o julgamento definitivo do dissídio”.

Por conta dessa liminar, a o Sindicato União dos Servidores do Poder Judiciário do Estado de São Paulo está proibido de conceder entrevistas sobre a greve e de participar das reuniões entre as categorias de servidores públicos do judiciário e a direção do TJ paulista. 

A liminar refere-se apenas ao Sindicato União por ser o representante legal da categoria, não se entendendo às entidades representativas. “Queremos justiça. Não incitamos ninguém. Os servidores não são ignorantes. Eles conhecem bem seus direitos e acreditam na democracia” afirma José Gozze.

Cenário Estadual

No âmbito das justiças estaduais, os servidores públicos do judiciário da Bahia estão em greve desde 7 de maio. Lá, durante a greve, são realizados apenas serviços considerados essenciais, como emissão de guia de sepultamento, alvará de soltura, habeas corpus, liminar para casos de saúde e de ligação de água e luz. A Polícia Civil também estava em greve, mas já retomou os trabalhos.

No Ceará a greve também foi deflagrada. O pedido cearense é, principalmente, o de enquadramento correto dos funcionários.  Maranhão, Pernambuco e Sergipe fizeram paralisações e já retornaram ao trabalho.

Justiça do Trabalho

Na Justiça Trabalhista, a greve atingiu o grau hierárquico máximo e atingiu o próprio Tribunal Superior do Trabalho. Lá, os funcionários estão parados desde o dia 25 de maio. Em 1º de junho, o presidente do Tribunal Superior do Trabalho, ministro Milton de Moura França, determinou os descontos nos salários dos servidores em greve. A intenção dos servidores é a de pressionar os parlamentares e Judiciário para a aprovação do Plano de Cargos e Salários, que reestrutura as carreiras dos servidores do Poder Judiciário (PL 6.613/09).

Os sindicatos de servidores da Justiça do Trabalho ainda devem manter uma equipe com no mínimo 60% em suas funções. Caso contrário, a multa será de R$ 100 mil em cada dia de descumprimento.

Descendo alguns degraus, no Tribunal Regional do Trabalho de Manaus, os trabalhos são prestados por 30% do efetivo, e apenas 5 das 19 Varas estão abertas. No Foro de Campo Grande, 18 dos 21 funcionários estão paralisados.

O TRT de São Paulo não aderiu à greve, mas a primeira instância está paralisada. Por conta disso, os prazos estão suspensos desde o dia 9 de maio. Na 15ª Região (que compreende 127 Varas do Trabalho na região de Campinas, onde tramitam mais de 100 mil processos), a suspensão é retroativa ao dia 6 de maio.

No Rio Grande do Sul, a paralisação fica por conta de apenas três varas, das 115 existentes. Na segunda instância, o funcionamento é normal. No Rio de Janeiro, a Justiça do Trabalho também mantém a rotina sem mudanças.

Na Justiça Trabalhista da Bahia, 60% do quadro administrativo das varas estão em funcionamento. De acordo com a Assessoria de Imprensa do TRT-BA, há um cenário de greve, com paralisação parcial, serviços essenciais como julgamentos, despachos, pagamentos estão disponíveis. Na segunda instância, o cenário de greve é praticamente nulo. Em Minas Gerais, está funcionando normalmente.

Cenário Federal

No Tribunal Regional Federal 1ª Região, apenas alguns servidores aderiram a greve e os serviços funcionam normalmente. O mesmo acontece com a Justiça Federal em primeira instância. Ela abrange os estados do Acre, Amapá, Amazonas, Bahia, Distrito Federal, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Minas Gerais, Pará, Piauí, Rondônia, Roraima e Tocantins.

O TRF-2 (Rio de Janeiro e Espírito Santo) está funcionando. Em primeira instância, os servidores estiveram em greve, mas os serviços também continuam a ser prestados normalmente. A Justiça Federal em São Paulo está em greve desde o dia 9 de maio. O TRF-3 publicou uma portaria na qual informa que os prazos estão suspensos.

Na 4ª Região, que compreende os estados de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná, as varas funcionam normalmente. No TRF-5 (Tribunal Regional Federal da 5ª Região) , que atende os estados de Alagoas, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Sergipe existem paralisações pontuais. Em assembleia setorial no TRE do Rio Grande do Norte, os servidores optaram por uma paralisação de 24 horas na segunda-feira (7/6), e também nova assembleia para deliberar sobre a greve por tempo indeterminado

No Ceará, em assembleia realizada no dia 31 de maio, foi decidido que os servidores da JF realizarão paralisações diárias das 14 às 16h. Durante o período de paralisação de duas horas da segunda-feira (7/6), os servidores optaram por aguardar assembleia marcada para 17 de junho, às 15h30, para decidirem se entram em greve por tempo indeterminado.

Fonte: Última Instância