No Dia do Trabalho, professores ocupam Centro CĂ­vico e evocam o 29 de abril


O clima de tranquilidade que tomou conta dos arredores do Centro Cívico, em Curitiba, na tarde do feriado de 1º de Maio pouco lembrou o campo de batalha em que se transformaram os espaços no entorno da Assembleia Legislativa (Alep) e da sede do governo do estado nesta semana.

Na primeira tarde sem protestos depois de três dias consecutivos de um cenário dominado por gritos, correria, tiros de balas de borracha, uso de spray de pimenta e bombas de gás lacrimogênio, pessoas, muitas ainda indignadas e assustadas, agrupam-se próximo ao Palácio do Governo para relembrar os episódios de guerra entre professores e policiais, que teve seu auge na quarta-feira (29).

Na quarta-feira, professores que se manifestavam contra aprovação do projeto de lei que mudou o fundo de previdência dos servidores estaduais foram enfrentados por equipes policiais, que cercavam o prédio da Assembleia, onde parlamentares votavam a proposta. Mais de 200 pessoas tiveram de receber atendimento médico. Pelo menos 213 manifestantes e 20 policiais ficaram feridos.

Cruzes e sangue

Na sexta-feira, nos gramados do Centro Cívico já não se viam mais barracas montadas por professores, nem grades de metal demarcando áreas “congeladas” pela Polícia Militar (PM). Havia uma grande quantidade de gente em busca dos pormenores do cenário que atraiu o olhar do mundo e ganhou espaço nos noticiário internacional.

Havia dois protestos marcados, mas a manifestação das 14 horas foi cancelada para que todos se reunissem pela manhã. Vestidos de preto, os manifestantes marcharam até o Palácio Iguaçu, sede do governo estadual.

“As pessoas que vão pra rua pedir a volta da ditadura militar têm que pensar muito bem antes de fazer isso, porque ditadura é isso que se viu nessa semana aqui em Curitiba”, disse a estudante de Pedagogia Fernanda Queiroz.

O luto foi o símbolo mais comum no Centro Cívico nesta sexta-feira. Cruzes, faixas pretas e manchas que representam simbolicamente o sangue foram espalhadas por boa parte da região. A bandeira do Paraná ganhou toques de cor vermelha, assim como a fonte em frente ao Palácio Iguaçu, que se assemelhou a um pequeno “lago de sangue”. Jalecos de professores foram espalhados pela Praça Nossa Senhora da Salete. As grades da sede do Legislativo estadual foram decoradas com faixas com inscrições como “A Educação está de luto”. A rotatória da Avenida Cândido de Abreu que dá acesso ao Palácio ganhou cruzes para cada um dos deputados que votou a favor do projeto.

A professora de educação física Neiva Mendes Naser explicava aos curiosos o significado das cruzes, como uma “aula aberta”. “Aqui é um velório. O velório da democracia”, disse. Por toda a praça Nossa Senhora da Salete, professores que estavam no local no dia do tumulto contaram sua experiência durante os momentos de terror.

“Uma colega minha professora, que está grávida, viu as imagens pela televisão e passou mal, teve sangramentos. A diretora do meu colégio, que estava bem na frente da grade na hora da correria, tem dificuldades para andar e teve que ser carregada pra fora daquele inferno. Até hoje não se recuperou”, disse a professora de Sociologia Talita Nascimento.

“Independentemente de sermos ou não professores, o que aconteceu é uma mostra do que pode acontecer com qualquer trabalhador nesse estado. O que se vê aqui hoje, depois de tudo, é uma vergonha”, comenta estudante Ângela Cristina Cardoso.

“Como nós vamos falar sobre respeito dentro da sala de aula, se o próprio governador não nos respeita? Como o aluno vai respeitar o professor e o governo bate no professor?”, questiona a pedagoga Nilza Wojciechowski.

Fonte: JORNAL DE LONDRINA